O tratado de Lisboa aprovado com toda a pompa foi colocado por baixo do tapete em todos os países da Europa. Excepto na Irlanda, onde por lei não havia nada a fazer senão levá-lo a referendo. A Irlanda é o país ideal para aprovar qualquer coisa pro-europeia: disparou economicamente graças à Europa; tem perto (no espaço, e na história) um país enorme, cuja importância se dilui no contexto europeu; tem muitos emigrantes e convive bem com isso.
E no entanto, o Não e o Sim estão empatados. É sempre mais fácil votar Não que Sim: qualquer coisa serve para o Não, mudar é difícil, muitos fantasmas são sempre agitáveis. Nesta campanha, os argumentos do Não são mesmo de toda a ordem: do cinismo mais básico (se rejeitarmos eles vão-nos oferecer mais) ao patriotismo mais simplório (eles morreram por uma Irlanda independente, não a deites fora); à mentira pura e simples (contra a guerra do Iraque, contra o tratado de Lisboa). A defesa do sim é amorfa: baseada no progresso económico mais quotidiano; as grandes ideias da Europa, do progresso esquecidas.
E o que é ser Europeu? O Euro está aí, o conhecimento da Europa e de amigos/as europeus está aí. Quando eramos miúdos isso era impensável, quando Espanha era longe, a fronteira fechava, e a passagem para o outro lado se fazia por um rio cheio de alforrecas. E entretanto adormecemos para esta transformação, fomo-nos habituando.
Há agora um certo malaise, a ideia que a Europa cinzenta comanda os nossos passos e não permite a identidade nacional. E é verdade que este poder centralizado comanda as nossas vidas, tornando até a política nacional muito mais irrelevante e sem história. Os cidadãos nesta Europa são abafados por um consenso técnico/politico/intelectual/mediático que nem uma porra de referendo permite.
E no entanto eu não tenho alternativa melhor; até gostaria que o referendo desse Não, só para agitar as coisas; mas a verdade é que em termos práticos isso provavelmente seria prejudicial para a Europa e para o progresso do mundo. Por isso feitas as contas, se calhar, prefiro que o Sim ganhe. Mas com tão pouco entusiasmo, tão pouco entusiasmo…