Na cave da sede do PS, à qual se acedia por umas escadas de madeira rangente, havia mapas do Distrito de Coimbra, o papel de cenário rabiscado com os nomes dos concelhos, subdivididos por freguesias, subdivididos por urnas. O fumo era denso, e o barulho e a excitação cortantes; o telefone sempre a tocar, portador de informação mais relevante do que a TV – imagem granulada, coberta de riscas gordas e trementes. Umas salas eram reservadas –só para os importantes– mas a informação explodia rapidamente por toda a gente. Grandes alegrias; ou pequenas alegrias – mesmo numa grande derrota, alguém ufanemente dizia que "na minha urna demos-lhes um banho". E eu, pequenito, todo contente lá pelo meio.
Esta excitação das eleições de escrutínio difícil, tortuoso, sem sondagens, sem muita informação, foi substituída por eleições clean, em que a Internet arrasa qualquer telefone – mapas a cores, percentagens, comparações com anteriores votações, gráficos instantâneos. Nos estúdios das várias televisões os "fazedores de opinião" informam-nos, público incauto, do que é uma vitória e do que é uma derrota, por vezes transformando umas nas outras, porque as expectativas não foram atingidas. As salas, por vezes, ainda se enchem de gente, menos fumo, silêncio absoluto no minuto imediatamente a seguir ao fecho das urnas em que as sondagens quase sempre acabam num segundo com a emoção. Mas há sempre alguém que no meio da derrota grita: "Na minha urna…".
Hoje, terça-feira, dia impróprio, vou ter uma volta ao passado, num outro país; eleições prolongadas (mas sem fumo…), resultados incertos até longas horas da madrugada. Senado, Assembleia dos Representantes, Governadores, referendos por vezes estranhos. Eleições importantes, em que a hipocrisia baseada nos valores morais e religiosos pode ser derrotada. E os States podem começar a voltar a ser o país livre, tecnológico, forte e profundamente respeitador do indivíduo e das suas idiossincrasias. Esperemos que não haja surpresas das más…